A Movicel, uma das três principais operadoras de telecomunicações do país, enfrenta uma grave crise que resultou na perda de cerca de dois milhões de subscritores nos últimos seis anos. Os dados divulgados pelo Instituto Angolano das Comunicações (INACOM) revelam um cenário preocupante para a empresa, que viu a sua quota de mercado despencar de 18% para apenas 2%.
A operadora, que em 2018 contava com 2,4 milhões de clientes, regista actualmente apenas 520.959 utilizadores, segundo os números mais recentes do regulador das telecomunicações. Esta queda acentuada coloca a Movicel numa posição cada vez mais frágil num mercado em crescimento.
Período crítico entre 2019 e 2021
A maior sangria de clientes ocorreu entre 2019 e 2021, quando a empresa perdeu 1,2 milhões de subscritores, representando uma descida de 45% face ao ano anterior. Especialistas do sector apontam a má qualidade dos serviços de voz e internet como principal factor desta debandada.
A situação agravou-se em Setembro de 2020, quando a Movicel implementou um aumento abrupto de preços que gerou forte descontentamento entre os utilizadores. Muitos clientes optaram por cancelar os seus contratos ou manter apenas uma linha secundária com operadoras mais estáveis.
“A conjuntura económica difícil e a inflação elevada desse período também influenciaram a decisão dos consumidores, que procuraram alternativas mais económicas e fiáveis”, explica fonte próxima do sector.
Concorrência intensifica pressão
A entrada da Africell no mercado angolano em 2022 aumentou significativamente a pressão sobre a Movicel. Enquanto o número total de utilizadores de telemóveis cresceu para 26 milhões em 2024 — um aumento de 10,7 milhões desde a chegada da nova concorrente —, a Movicel não conseguiu aproveitar esta expansão.
Actualmente, a Unitel domina o mercado com 73% de quota, servindo 19 milhões de clientes. A Africell conquistou rapidamente 25% do mercado, equivalente a 6,5 milhões de assinantes. A Movicel, por sua vez, luta para manter os seus pouco mais de 520 mil clientes numa conjuntura cada vez mais competitiva.
Infraestrutura desactualizada compromete serviços
Apesar de herdar infraestruturas da antiga Angola Telecom, a Movicel tem falhado na modernização destes sistemas. A falta de investimento tecnológico deixou-a em desvantagem, especialmente com o avanço da tecnologia 5G, já disponível nas operadoras concorrentes.
A empresa enfrenta ainda graves dificuldades operacionais, incluindo o encerramento de lojas físicas, atrasos no pagamento de salários aos funcionários e problemas com fornecedores. Estas questões têm impacto directo na qualidade do atendimento ao cliente.
Muitos utilizadores relatam dificuldades em efectuar ou receber chamadas, usando os cartões SIM da Movicel principalmente para acesso à internet, embora enfrentem instabilidades mesmo neste serviço.
Serviços de dados também em queda
O problema não se limita às chamadas telefónicas. O número de clientes que utiliza os pacotes de dados da Movicel caiu drasticamente para 350.251 utilizadores de internet móvel em 2024, uma redução de quase 50% em seis anos. Entre 2023 e este ano, a operadora perdeu 277 mil clientes neste segmento.
Enquanto isso, a Unitel e a Africell têm conquistado terreno com pacotes mais competitivos e redes mais abrangentes, incluindo cobertura em zonas rurais e expansão da tecnologia 5G.
Clientes expressam frustração
Ana Maria, residente em Luanda e cliente da Movicel, expressa a frustração comum entre os utilizadores: “É frustrante. Às vezes, nem consigo fazer chamadas e a internet é muito lenta. Só mantenho o cartão para usar dados, mas até isso piorou”.
Estas queixas reflectem o sentimento de abandono sentido por muitos utilizadores que outrora confiavam na marca, evidenciando a necessidade urgente de melhorias no serviço.
Futuro incerto exige mudanças urgentes
Perante este cenário, a Movicel enfrenta um futuro incerto no mercado das telecomunicações angolano. Para recuperar competitividade, a empresa precisa urgentemente investir na actualização da sua infraestrutura, melhorar a qualidade dos serviços e rever completamente a sua estratégia comercial.
Sem estas mudanças estruturais, a operadora corre o risco de continuar perdendo espaço num mercado que continua em crescimento e atrai novos investidores, podendo até questionar a sua viabilidade a médio prazo.
Fonte: Jornal Expansão