Juristas angolanos defenderam hoje que “é urgente” uma revisão “profunda” da Constituição de Angola, considerando que o documento é o primeiro e principal obstáculo ao desenvolvimento socioeconómico sustentável e de um verdadeiro Estado democrático de direito.
Para Sérgio Raimundo, a expressão “ajuste da Constituição” é minimalista em relação à dimensão do problema face à realidade que Angola vive pelo que “é urgente uma revisão profunda”.
“É urgente porque a atual (…) é o primeiro e o principal obstáculo ao desenvolvimento socioeconómico sustentável e da promoção do bem-estar social de todos os angolanos”, referiu.
Por outro lado, apontou a necessidade de uma estabilidade política no país da construção de uma nação verdadeiramente angolana, com um processo de reconciliação genuíno e inclusivo, como a segunda razão para a revisão urgente da Constituição, lamentando a exclusão de Holden Roberto (FNLA) e de Jonas Savimbi (UNITA) nas condecorações dos 50 anos de independência de Angola.
“E ontem [quarta-feira] mesmo ouvi que o nosso parlamento negou reconhecer os líderes de outras forças políticas que, a par do MPLA [partido no poder] estiveram na origem na conquista da nossa independência, eu não sei por que razão”, lamentou.
De acordo com Sérgio Raimundo, a Constituição, aprovada em 2010 e revista pontualmente em 2022, “não ajuda à reconciliação do país”, defendendo que qualquer “reconciliação genuína e inclusiva terá de começar pela Constituição”, até porque “foi apenas aprovada pelo MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola)”.
O parlamento angolano aprovou na quarta-feira a condecoração de António Agostinho Neto e José Eduardo dos Santos, primeiro e segundo Presidente de Angola, respetivamente, excluindo Holden Roberto, líder histórico da Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) e Jonas Savimbi, líder fundador da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) nas homenagens dos 50 anos de independência.
“Ninguém pode contar a história da independência de Angola sem falar do Acordo de Alvor –assinado em janeiro de 1975 em Algarve, Portugal, entre o Governo português e os líderes dos então movimentos de libertação António Agostinho, Holden Roberto e Jonas Savimbi [UNITA] que estabeleceu parâmetros para a independência de Angola – qual é o mal em aceitarmos Savimbi e Holden Roberto como referências da luta pela independência se isto é uma realidade incontornável?”, questionou ainda.
O jurista Manuel Cangundo também defendeu que a Constituição congrega disposições que devem ser revistas para a concretização de um verdadeiro Estado de direito.
O jurista sinalizou a nomeação dos juízes dos tribunais superiores pelo Presidente “como uma das preocupações fundamentais” que beliscam a materialização de um Estado democrático.
“Infelizmente temos em Angola homens fortes e instituições fracas e esta questão da nomeação dos juízes aos tribunais superiores tem reflexo no final do dia na vida de cada um de nós, pela necessidade de um tribunal isento e parcial”, sublinhou.
A fiscalização dos atos do executivo pela Assembleia Nacional, no entender de Manuel Cangundo, também deve ser revista, porque a assembleia ou o parlamento “é o verdadeiro poder que representa as aspirações do povo”.
“Infelizmente em Angola temos um parlamento sem poder ou competência para fiscalizar os atos do executivo”, rematou o jurista.
A mesa-redonda decorreu no âmbito do Projeto Debates na Academia promovido pela UNIPIAGET. Lusa
O agravante disso tudo, é a contínua violação da CRA tanto pelo próprio Presidente da República, quanto pelos Deputados à Assembleia Nacional que aprovam leis que não têm um impacto directo na vida dos angolanos e de Angola.
Quando, entre todos os poderes constitucionalmente consagrados não pensam o “País” e o “Povo” que os elegeu em cada pleito eleitoral, mas põem tudo à disposição de seus interesses, a consequência é termos dirigentes gatunos e assassinos.
Outrossim, muitos de nós, pelo facto da fome, vendemo-nos facilmente ainda que formos académicos. O pior de tudo é a concentração de poderes e das riquezas por um único. Minha opinião seria, nós que trabalhamos com as OSC nos levantarmos contra essas práticas se não fossemos também famintos.