A Universidade Privada de Angola (UPRA) está no centro de uma polémica devido à obrigatoriedade de assinatura de contratos de “prestação de serviços educacionais” no valor de 25,5 mil dólares (equivalente a 23,3 milhões de kwanzas, ao câmbio do Banco Nacional de Angola de 5 de Agosto de 2025) para os estudantes do curso de Medicina. Segundo fontes do Ministério do Ensino Superior, Ciência, Tecnologia e Inovação (MESCTI) e especialistas jurídicos, a prática é considerada ilegal, violando a legislação angolana.
Contrato milionário e exigências financeiras
Os candidatos ao curso de Medicina da UPRA, além de demonstrarem aptidão académica, devem comprovar capacidade financeira antes da matrícula, fornecendo informações sobre o emprego e os rendimentos próprios ou dos seus encarregados de educação. O contrato, que estipula o pagamento de propinas ao longo dos seis anos do curso, fixa o valor em dólares, mas determina que os pagamentos sejam feitos em kwanzas, com base na taxa de câmbio do BNA no início de cada semestre.
Em 2022, a propina mensal era de cerca de 170 mil kwanzas, mas, devido à depreciação do kwanza, o valor actualizado para 2025 é de aproximadamente 323.611 kwanzas por mês. O contrato prevê um desconto de 10% para quem pagar a totalidade do curso antes do início das aulas, o que, ao câmbio actual, representa uma poupança de cerca de 2,3 milhões de kwanzas. Contudo, o valor de 25,5 mil dólares cobre apenas as propinas, excluindo custos adicionais como material didáctico, exames de recurso, revisões de provas, matrículas e emissão de documentos, o que torna o curso de Medicina da UPRA o mais caro do país.
Ilegalidade e oportunismo
Nguilima Wina, director do Gabinete de Inspecção do MESCTI, afirmou que “nem o regime jurídico nem o decreto executivo sobre o ajuste das propinas prevêem este tipo de contrato”. O Ministério já classificou a prática como ilegal e prometeu investigar a situação.
A obrigatoriedade dos contratos teve início em 2020, após um aumento significativo das propinas do curso de Medicina, que passaram de 48 mil kwanzas para 175.950 kwanzas mensais. Fontes anónimas revelaram que a UPRA implementou os contratos de forma “oportunista e sem negociação”, com o objectivo de “separar o joio do trigo”, ou seja, seleccionar apenas estudantes com maior capacidade financeira.
“Antes de entrares, perguntam o que fazem os teus pais, quem vai pagar as propinas e se têm emprego. Só depois de assinar o contrato é que podes começar a estudar”, revelou um estudante do terceiro ano, que preferiu o anonimato, destacando que a assinatura do contrato é uma condição indispensável para frequentar o curso.
Resposta da UPRA e contradições
A reitoria da UPRA confirmou a adopção dos contratos em 2020, alegando que a prática foi comunicada ao MESCTI e fundamentada nos “princípios gerais do Direito”, como a liberdade contratual, a boa-fé e a segurança jurídica. A instituição defende que a legislação angolana permite contratos em moeda estrangeira e afirma que, actualmente, todos os contratos são celebrados em kwanzas. No entanto, a fixação do valor em dólares contradiz esta afirmação, já que o pagamento em kwanzas depende da taxa de câmbio.
Falta de transparência
Outro ponto de crítica é a ausência de informação clara sobre a obrigatoriedade do contrato. O regulamento académico da UPRA para o período 2021-2025 não menciona a necessidade de assinatura de um contrato de prestação de serviços educacionais como requisito de matrícula, prática que se aplica exclusivamente ao curso de Medicina.
O advogado Agápio Meno considera que o contrato viola princípios como a autonomia privada, a boa-fé e os direitos do consumidor, reforçando a ilegalidade da prática.
Fonte: Jornal Expansão