A proibição do pagamento em dólares às empresas prestadoras de serviço no setor de petróleo e gás está a gerar forte controvérsia em Angola. Especialistas alertam que esta medida faz com que milhões de dólares fiquem fora do país, depositados em contas no Dubai, Panamá ou Ilhas Maurícias.

José de Lima Massano, ministro de Estado, confirmou na semana passada que não haverá alterações na lei cambial que impede que empresas prestadoras de serviços no setor recebam pagamentos em dólares dos operadores internacionais instalados no país.

Segundo apurou o nosso jornal, praticamente todo o setor, incluindo empresas locais, multinacionais, especialistas, a Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANPG), o próprio ministério de tutela e o Banco Nacional de Angola (BNA), defende que a lei deveria ser alterada, mesmo que temporariamente, ou que pelo menos fosse realizado um estudo detalhado para avaliar os impactos económicos dessa medida.

No entanto, muitos agentes do setor evitam expressar estas opiniões publicamente. Internamente, justificam que não podem comentar abertamente as declarações de líderes, especialmente considerando que o próprio ministro é o autor da legislação.

Baixa Participação Nacional Preocupa Setor

Os investimentos do setor petrolífero nos últimos anos em Angola rondaram os 30 a 35 mil milhões de dólares anuais, com novos licenciamentos e desenvolvimento de projetos de produção. De acordo com dados da PetroAngola, o valor dos custos com bens e serviços aproximou-se dos 15 mil milhões de dólares por ano, sendo que deste montante apenas 2% foi captado por empresas nacionais, pouco mais de 200 milhões de dólares.

“Os benefícios que a indústria de petróleo e gás traz para o empresariado nacional são residuais, apesar de todas as teorias e intenções de defesa do conteúdo local”

A situação torna-se ainda mais preocupante quando se verifica que as empresas nacionais são responsáveis por apenas 2% da produção de crude em território angolano. Isto significa que os benefícios do petróleo para a economia acontecem quase exclusivamente através da captação de taxas e impostos.

Esta realidade contrasta com a de outros países produtores como o Brasil e a Nigéria, onde a participação local no negócio e na produção é, em média, dez vezes superior à angolana.

Desvalorização do Kwanza Agrava Situação

Um dos fatores apontados pelo setor como limitador para a presença do empresariado angolano neste negócio é a proibição do pagamento em dólares por parte das operadoras multinacionais às empresas de serviços.

“Por exemplo, faz-se um contrato com um operador de 50 milhões de dólares, emite-se a fatura do valor correspondente em kwanzas, mas quando se recebe a 45 ou 60 dias, no mínimo, o valor em moeda nacional já não corresponde a esse valor em dólares”, explica um acionista de uma das empresas angolanas de referência que pediu anonimato.

Nos últimos quatro meses, o valor do kwanza tem estado estável, mas é importante recordar que nos últimos três anos a moeda nacional passou de 415 kwanzas por dólar em abril de 2022 para os atuais 912 kwanzas.

“Isso foi dramático para todas as empresas nacionais do setor. Várias faliram ou abandonaram a atividade”, acrescenta a fonte.

Perdas Na Conversao Cambial

Mesmo com estabilidade cambial, a conversão representaria perdas significativas: “Na operação de receber em kwanzas e depois trocar esses kwanzas em moeda estrangeira, perdemos cerca de 12%. Se receber 50 milhões de dólares em kwanzas e depois utilizar esses kwanzas para comprar dólares, com todas as taxas e diferenças de câmbio entre compra e venda, vai poder ter acesso, no máximo, a 44 milhões de dólares. Lá se foi a margem de negócio.”

Com a lei atual, muitas empresas optam por estruturas duais, mantendo uma entidade sediada em Angola e outra no estrangeiro, permitindo que a maior parte dos pagamentos seja recebida em moeda forte fora do país. Expansão

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