A guerra comercial desencadeada pelo Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ameaça ter consequências significativas para a economia angolana. Surpreendentemente, o maior impacto não virá da tarifa recíproca de 32% (temporariamente suspensa por 90 dias), nem coloca em causa a relação bilateral estabelecida durante a administração Biden – que culminará na cimeira de negócios EUA-África prevista para junho em Luanda.
Petróleo em Queda
O verdadeiro perigo para Angola reside no abrandamento da atividade económica global que esta guerra comercial poderá provocar. Com uma diminuição da procura mundial, o preço do petróleo tende a seguir uma trajetória descendente, afetando diretamente as receitas públicas do país – tanto através das vendas diretas como da arrecadação de impostos.
Dependência Crítica do Petróleo
O petróleo representa 55% das receitas fiscais de Angola, sendo que 66,4% destas são destinadas ao pagamento do serviço da dívida. Esta situação cria uma pressão considerável sobre a tesouraria nacional quando as receitas diminuem.
Números da Exportação
Em 2024, Angola exportou 393,4 milhões de barris de petróleo bruto, gerando uma receita de 28,1 mil milhões de euros, com um preço médio de 79,7 dólares por barril. A China lidera como principal destino (51,91%), seguida pela Índia (10,02%), Espanha (6,27%) e Indonésia (4,81%).
Alarmes do FMI
O Fundo Monetário Internacional já havia alertado em fevereiro sobre estas vulnerabilidades. Na sua análise no âmbito do artigo IV, o FMI sublinhou que o elevado serviço da dívida externa limita as despesas de desenvolvimento, enquanto a dependência do petróleo continua a ser um obstáculo ao crescimento sustentável do país.
“O risco de liquidez poderá intensificar-se caso as condições de financiamento se deteriorem, reduzindo ainda mais as despesas sociais e exercendo pressões sobre a taxa de câmbio”, advertiu o FMI.
Preços Abaixo das Projeções Orçamentais
Atualmente, o preço do barril situa-se nos 64 dólares – um valor em recuperação comparado com os 60 dólares da semana passada, mas ainda abaixo dos 70 dólares previstos pelo Governo no Orçamento Geral do Estado para 2024. Embora a Sonangol assegure manter a produção de 1,098 milhão de barris diários, o encaixe financeiro deverá ser menor que os 35 mil milhões de dólares contemplados no orçamento.
Saída da OPEP e Prospeção em Risco
Angola saiu da OPEP em janeiro deste ano para aumentar a produção sem estar sujeita às quotas impostas pelo cartel. Contudo, a redução da procura global poderá afetar negativamente a atividade de pesquisa e prospeção petrolífera no país.
Acordos recentes de prospeção, como os firmados entre a Agência Nacional de Petróleos e Biocombustíveis e empresas como a TotalEnergies e a ExxonMobil para avaliar o potencial das Áreas Livres dos Blocos 17/06 e 32/21, poderão ficar em suspenso.
Apesar da Agência Nacional continuar a atribuir novas concessões – estimando mais 10 até ao final do ano para juntar às 40 já existentes – o investimento necessário será difícil de concretizar num cenário de estagnação do mercado petrolífero. JN